Pular para o conteúdo principal

O Polvo

  Naquele aquário havia um polvo. Este era sempre admirado pelos visitantes da casa. O dono da casa, um senhor de cabelos prateados e sorriso largo, era muito simpático e acolhedor, o que fazia que sua casa fosse sempre frequentada, e logo na sala grande com lareira para o inverno e próxima a um janela acortinada, ficava a caixa de vidro de Felisberto, o polvo, isso mesmo, ele tinha nome.


   O polvo era dono do aquário todo, que media cerca de 1,00 por 2,60 cm, e lá em meio a algas, pedras e alguns corais que fora comprado, o polvo fazia seu balé e por vezes ficava grudado na parede de vidro. A solidão de estar só naquele ambiente parecia a olhos vistos não fazer diferença ao molusco que se movimentava e dormitava em posições estranhas, enrolando seus tentáculos ou expondo suas ventosas para serem admiradas pelos curiosos.


   Seu dono, que zelava de bom grado pela manutenção do aquário e dedicava atenção ao polvo, teve um infarto fulminante e veio a falecer. Assim, o polvo ficou a mercê de outros tratos e destratos, por vezes, seu aquário se apresentava estranho com uma opacidade que não era natural, pois faltava limpeza e dedicação, coisas que geralmente vem com boa vontade.


   O tempo se passou e a casa já não era tão frequentada como antes, pois faltava o espirito alegre do antigo dono, e assim o polvo acabou sendo quase esquecido, naõ tendo os cuidados necessários. Um ou outro familiar, se lembrava de por comida ou um dia ou outro limpar o vidro, o que não era bem feito, também; na verdade, Felisberto estava deixado de lado, havia adolescentes preocupados com jogos virtuais, um adulto envolto em questões financeiras e aplicações na Bolsa de valores e um senhora, bonita  e elegante muito preocupada com a aparência de seu rosto, corpo e cabelos, mantinha uma agenda cheia, entre cabeleireiro, massagistas, manicure, ioga e todos profissionais da estética. A  empregada que fazia todo serviço da casa, mal tinha tempo para cuidar do aquário, o que levou Felisberto a ficar cada vez mais inerte e encolhido.


   Um dia, alguém teve uma ideia de levar o polvo para um aquário ornamental e deixar lá para ser cuidado, e ninguém se opôs, afinal aquela caixa de vidro ocupava lugar  e não bem decorativa, e assim foi feito; Felisberto foi transferido para um local  comum a sua espécie, onde havia vários peixes e moluscos, e claro não tinha tanto espaço, mas poderia ser observado e alimentado. Quem visitava o local via numa caixa de vidro acanhada um borrão escuro amontoado num cantinho, imerso num água meio esverdeada, e não havia mais os movimentos constantes que indicavam a vitalidade de outrora. Felisberto estava deixando de existir.






Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Apresentação

A vida é uma grande viagem, com direito a várias paradas em estações a escolher .Nem sempre podemos optar por não levar bagagens conosco, outras vezes, temos a escolha e nos quedamos frente à muitas objeções e contestações externas, sobre o que carregarmos e até onde podemos levar tudo que amealhamos em vida, sejam os laços sanguíneos, de amizade, ou coisas materiais, que nada podem agregar ao sentido pessoal da nossa viagem. Por entre vias, veredas e atalhos, vamos seguindo nesta "nave" com direito a erros e acertos, conquistas e perdas, nada é terminal, a não ser a própria finitude em si. Depositamos na vida todos nossos anseios e sonhos, e na viagem, temos muitos felicidades e também dissabores, entretanto, somos nós autores desta escrita diária que se faz com lágrimas de alegria ou tristeza, sempre imprimindo uma nova ordem a um caos interno que buscamos o tempo todo apaziguar.  Somos etéreos em espírito, somos humanos falhos e aprendizes.  Vamos seguindo ora...

Doce atrevimento ( Poesia nº 10)

                Na delicadeza dos toques teus sinto a leveza do amor que permeia  nessa intimidade doce e atrevida   Demoradamente me atiças na maciez dos lençóis me excita a suavidade aquece e incendeia  Atrevimento dos desejos em desalinhos   delicadezas e arroubos em uníssono fluindo    

O coelho e a raposa (Uma fábula atual)

Era uma vez um coelho, que não era branco e nem de conto de fadas. O coelho que não era branco se "amigou', se é que isso é possível no mundo animal, por uma raposinha dourada, que encontrou, por acaso, escondida na floresta. Ela, a raposinha, era pequena e ágil, mas só isso a caracterizava como tal, pois era muito medrosa e vendo o coelho que não era branco, andar por entre os arbustos, se escondeu. O coelho pressentiu que alguém o espreitava e não teve medo, foi tentando identificar pelo cheiro o que havia ali. Cheira daqui, cheira dali, o coelho que não era branco, entre galhos, amontoados,  folhas e ramos foi procurando. Até que achou encolhida, de olhos espantados,a raposinha dourada que estava numa fenda entre de uma pedra. - Ei! O que houve? Quem é você? Por que está escondida? Venha cá. A raposinha sentindo-se ameaçada tentava encontrar um meio de sair dali.  O coelho que não era branco, percebeu que a sua " amiguinha" de exploração era muito tímida ou medros...